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Niterói, Rio de Janeiro, Brazil
Estudante, professor e agente da História de seu tempo. Deformado pela Universidade Federal Fluminense, pela capacidade de resiliência em torno de causas justas, pela coragem e pela sinceridade. Dinâmico, espiritualista, intuitivo, libertário, imprevisível. A leitura de seus textos é recomendada a quem faz uso de covardias.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Homenagem


     Seu encontro foi importante em minha vida. Mandamos para os lugares mais indesejados do universo todas as podridões humanas. Possuímos a vantagem de saber que nem o universo suporta, para si, muitas das quais os homens veneram, temem ou cultivam. Costuma devolver, fazer encarar. Em um tempo de ímpetos maiores, fomos muito felizes na cama e nos propósitos humanitários. Você não morreu, não sucumbiu de todo, mas mudou. O tempo cuidou de casá-lo com os meus inimigos e este parece ser um destino óbvio dos jovens revolucionários que envelhecem. Óbvio para o senso comum, logo frágil para os que aprimoram a sensibilidade nos feitos. Nós sabemos quem somos de verdade, um e outro afora as aparências, e, justamente por isso, que ainda resistimos à ideia de que podemos estar próximos demais novamente. Você sempre preferiu o personagem social, eu a essência à flor da pele. Não quero descuidar de sua cautela e ameaçar o que construiu na minha ausência. Reencontro-lhe enquanto notícia e ainda quero oferecer o ânimo necessário para os seus propósitos. Sei que, ainda que eu discorde dos seus métodos, não posso resistir à verdade das nossas intenções e das nossas causas. Acredito na nossa poesia e jamais rebaixarei seus versos, sob pena de perder o sentido da obra, que, de fato, é nossa e nem nos pertence.

            Senti vontade de escrever-lhe porque talvez esteja sentindo o mesmo que sinto quando tocam no seu nome. Disfarço e mudo de assunto. Aquela sensação incrível que sobe dos pés, toma o corpo e puxa um sorriso, devo-lhe confessar, ainda existe. Seu cheiro ressurge da beleza fonética alheia que o cita com entusiasmo, critica ou vocifera ciúmes. Há os que realmente sentem, não ignoram, mas também não ouviram de meus lábios a certeza que os convence. Você sabe que isso é possível e não é prerrogativa de Clarice ou Sartre, seja lá de quem delimitou primeiro a imprecisão do impacto da sensibilidade na linguagem verbal. Informam-me dos seus atos e o pau se manifesta, os pelos do meu corpo se arrepiam, aquela vibração (lembra?) ressoa. Minha boca se enche de saliva e o meu pescoço relembra o contato fervoroso do carinho que o esquentava. Tantos anos de distância e não imaginava que fosse sentir outra vez! Não sei se devo alimentar estas sensações, mas você sabe o quanto é difícil controlá-las. Isto não me peça para fazer!

         Prefiro a “ilusão” da reciprocidade. Você sabe muito bem até que ponto chegamos sempre que se tentou a negação do desejo, não preciso forçar-lhe a memória... como sabe muito bem que quando um sente e lê o que estou descrevendo é porque o outro, como que por telepatia, já abrira canal à oportunidade. Posso estar floreando esta homenagem porque meus leitores  têm nomes a explorar, são tomados pela curiosidade latina, e sei que devo preservar-lhe de outros problemas. Como gosto de preservar os leitores de onde, em verdade, extraio certo sumo de inspiração. Mas você sabe que é para você, que se confunde e me deseja à esta altura, que a homenagem se pretende. Não sou a lenda inacessível ou o passado que carrego de celebridadezinha, alguém de respeito ou admiração forçados, incapaz de curti-lo outra vez, mais uma vez ou na exata vez que o curso dos acontecimentos dispor. Sou quem lhe causa essa contrariada necessidade e, por tal, diferencio-me do que você arrumou para dar conta à saciedade comum. E, para mim, você é quem soube identificar melhor o meu olhar, os meus gestos, os meus sonhos, os meus desejos, a minha estranha caracterização altruísta e a farsa com que desempenho a negação pública do tesão por alguém.

    Eu reluto mas penso, sinto o seu cabelo, seu beijo, seu pau, seu abraço, seu carinho, sua voz, sua presença de espírito... desenvolvo a esperança de nos reencontrarmos hoje, agora, daqui a pouco, em qualquer lugar e lá, onde todo mundo também verá, não apenas dois homens em pecado, mas a gloriosa rendição dos preconceituosos ao Amor Pleno. Todo silêncio social expira. Pode até ser o seu maior medo. Quando você tiver medo, não agrida ninguém. Lembre que os nossos encontros sempre nos encorajaram a vencer sem violência, sempre geraram resultados outros, extremamente felizes, que jamais mensurávamos o alcance. A ligação do trabalho que faltava. O perdão do pai que estava em fúria. O dinheiro que parecia tão difícil. A tristeza que se doía no peito e, subitamente, parou. A música do artista na rua que parecia adivinhar o sentimento. A ideia que faltava. A solução para um problema histórico e pertinente. As razões para rir mais do que reclamar da vida.

      Esta homenagem só faz sentido se você existir e quiser existir. Não faz sentido a nossa distância, sequer resolve o problema de quem a provoca. Pense que eu estou à sua espera e o mundo, tomado pela energia poderosa que advém do cumprimento de um desejo forte, se amplia e nos abraça. Só o Amor, a Coragem e a Verdade corrompem o mundo como deveria.

Pela Revolução do Afeto,

                                           Calo e sinto, Calado.

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